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Tinariwen inebriará o público de Amarante com seu desert blues

03/05/2017

Por Deborah Dumar

Foto: Divulgação

Com mais de 1.200 concertos em todo o mundo, um Grammy de “melhor álbum de world music” (2012) e um BBC Music Award (2005) na bagagem, a cultuada banda tuaregue está novamente na estrada com seu desert blues. Desta vez para lançar o oitavo CD, “Elwan” (“Elefantes”), gravado entre os subúrbios de Paris, em um estúdio improvisado no Joshua Tree (Califórnia, EUA) e o Marrocos. O álbum é considerado pela crítica como um dos melhores já produzidos pelo grupo, desde que surgiu no mercado internacional há quase 20 anos, e será lançado em Portugal durante o MIMO Festival Amarante.

Através de suas potentes guitarras e canções que falam do exílio, rebeldia e dos sonhos de liberdade e paz para o Norte do Mali – transformado em zona de conflitos entre o Exército e os extremistas islâmicos ligados à al-Qaeda – os músicos do Tinariwen inspiram os jovens nômades do Saara e o respeito da comunidade internacional de música. Entre os artistas consagrados pelo público que os admiram e apoiam estão Robert Plant, Santana, Bono Vox, Edge, Chris Martin, Brian Eno e Thom Yorke.

Porém, as coisas mudaram de figura para o Tinariwen, a partir do momento em que o conflito atingiu diretamente a banda, em meados de 2012, com o sequestro do vocalista Abdallah ag Lamida pelos extremistas (ele viria a ser libertado no início do ano seguinte). A colaboração dos artistas, produtores e estúdios dos EUA e da Europa se tornou uma constante na trajetória do Tinariwen.

Enquanto o álbum “Tassili” (de 2011), com que o grupo conquistou o Grammy, trazia as participações da banda indie nova-iorquina TV On The Radio e da Dirty Dozen Brass Band, de Nova Orleans, o seguinte, “Emmar” (2014), gravado no Parque Nacional Joshua Tree (EUA) – o primeiro trabalho que fizeram longe de seu país, devido à instabilidade política no Mali – contou com a presença de Josh Klinghoffer, Fats Kaplin, Matt Sweeney, and Saul Williams.

No novo álbum, como de praxe, o grupo convidou alguns artistas com quem tem afinidade para participações especiais. Nos créditos de “Elwan”, aparecem o cantor Kurt Vile, Mark Lanegan (que integrava a banda grunge Screaming Trees), Alain Johannes (ex-guitarrista da Queens of the Stone Age) e o guitarrista Matt Sweeney, que trabalhou com diferentes artistas, de Will Oldham ao grupo Run the Jewels. No intervalo entre os dois projetos, o grupo registrou um álbum ao vivo em Paris.

Antes de chegar a Portugal, a nova turnê internacional do Tinariwen terá percorrido numerosas cidades da Suíça, Suécia, Bélgica, França, Alemanha, Espanha, Holanda, Dinamarca, Turquia, Inglaterra, Escócia, Canadá e Estados Unidos, desembarcando mais afiada do que nunca no palco do MIMO Festival.

Visibilidade 

Antes mesmo de lançar o CD de estreia, “The Radio Tisdas sessions”, em 2001, que foi produzido pelo britânico Justin Adams e o francês Jean-Paul Romann nos estúdios da emissora de rádio malinesa.

o Tinariwen chamou a atenção do conjunto de world music Lo’Jo, que conheceu alguns de seus integrantes em um festival realizado em Bamako e os convidou a embarcar para a França, a fim de que participassem de seus concertos.

A parceria com a banda do Mali resultou na organização do Festival au Désert, em 2001, Essakane, que teve Tinariwen como headliner. Foi ali que os tuaregues, cantando em sua língua nativa, o Tamakesh, começaram a se destacar no cenário internacional, a excursionar regularmente pela Europa, EUA, Japão e Australia e a se apresentar em grandes festivais, como o Coachellla, Womad, Roskilde e Glastonbury.

O lançamento global dos álbuns “Amassakoul” (“O viajante”), em 2004, e “Aman Iman” (“Água é vida”), de 2007, consolidou o prestígio e a popularidade da banda africana no mundo ocidental. O sucesso atraiu jovens músicos para o coletivo, que, em 2009, lançou “Imidiwan” (“Companheiros”).

Em 2010, o Tinariwen alcançou ainda mais visibilidade ao participar, como representante da Algéria, da cerimônia de abertura da Copa do Mundo, assistida por bilhões de espectadores em todo o planeta. Naquele mesmo ano, os músicos fizeram 24 apresentações em excursão pelos EUA.

Breve histórico sobre ‘Os rapazes dos desertos’

Os fundadores do Tinariwen passaram os anos 1980 escondidos em campos militares líbios, sonhando com dignidade e autodeterminação para o seu povo, o Kel Tamashek, do Sul do Saara, através das canções que influenciam toda uma geração de tuaregues.

Liderada pelo cantor e guitarrista Ibrahim ag Alhabib, que testemunhou a execução do pai, em 1963, durante uma rebelião no Mali, a banda foi criada em 1979.  Ao assistir Roy Orbison tocando uma guitarra que se transformava em arma no western “The fastest guitar alive”, o pequeno músico improvisou seu primeiro violão, distraindo-se com temas de seus ancestrais e melodias pop árabes.

Sem o pai, Ag Alhabib mudou-se para um campo de refugiados da Algéria indo morar, em seguida, nos desertos que circundam o oásis de Tamanrasset. Posteriormente, dividiu casa com outros exilados tuaregues na Líbia e também na Argélia. Nos anos 1970, reuniu-se a outros músicos da comunidade de rebeldes tuaregues, experimentando as músicas de protesto de grupos marroquinos, pop argelinas e sucessos de artistas ocidentais – Elvis Presley, Jimi Hendrix, Dire Straits, Bob Marley e Led Zeppelin, entre outros.

Com seu primeiro violão de verdade, Ag Alhabib decidiu criar um grupo para animar festas e casamentos na Argélia. Como não tinha um nome artístico, as pessoas os chamavam de Kel Tinariwen (“Os povos dos desertos” ou “The desert boys”). No ano seguinte, o chefe de Estado líbio, Muammar al-Kadhafi, tentou montar um regimento com os melhores lutadores tuaregues atraindo os jovens para o serviço militar. Ag Alhabib e seus companheiros atenderam ao chamado e receberam treinamento durante nove meses.

Em 1985, no entanto, foram seduzidos por uma proposta parecida, mas que vinha de líderes do movimento rebelde dos tuaregues, também na Líbia. Encontraram no acampamento militar vários músicos que cantavam e tocavam guitarra. Resolveram, então, formar um coletivo – batizado, então, de Tinariwen – para compor músicas que abordassem a cultura e as questões enfrentadas pelos tuaregues, gravando-as em fitas-cassete, que eram vendidas por todo o Saara.

O grupo retornou ao Mali em 1989, porém outra revolta contra o governo estourou e integrantes do Tibariwen se envolveram no combate como rebeldes. O acordo de paz foi assinado em 1990 e, finalmente, eles optaram pela música, como meio de vida e principal arma na luta pela independência da nação tuaregue. Ganhou o público, que se inebria com o som hipnotizante das extraordinárias performances da banda, que se apresenta nos concertos com os trajes e turbantes tradicionais da África Ocidental.


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