Nação Zumbi, expoente do Manguebeat, apresenta seu som inovador em Portugal
A Nação Zumbi está de volta aos palcos com um álbum de inéditas, o décimo da banda, depois de anos longe dos estúdios. O grupo pernambucano é uma das atrações da segunda edição internacional do MIMO Festival, na charmosa cidade de Amarante (Portugal), onde apresentará o mesmo concerto que o levou de volta ao SummerStage Festival, em Nova York.
Neste trabalho, a Nação reaparece investindo em uma sonoridade diferente daquela que a consagrou na época de sua criação e do surgimento do movimento de contracultura Manguebeat, nos anos 1990. O grupo ganhou projeção nacional com seu som revolucionário, que misturava o explosivo ritmo da bateria do maracatu ao rock, reggae, hip hop, funk, rap e à música eletrônica, e letras contundentes contra a desigualdade social.
A partir do lançamento dos primeiros álbuns, “Da lama ao caos” (1994) e “Afrociberdelia” (1996) – que ocuparam a 13ª e a 18ª posições, respectivamente, na lista dos 100 melhores discos da música brasileira, da revista “Rolling Stone” – a banda também cravou seu nome no cenário internacional, fazendo turnês e tendo seus álbuns prensados nos EUA, Europa e Japão.
A regravação de “Maracatu atômico”, composição de Nelson Jacobina e Jorge Mautner, que se tornou um dos maiores hits da carreira de Gilberto Gil na década de 1970, fez um sucesso estrondoso com a Nação Zumbi – assim batizada em homenagem ao líder dos escravos refugiados no Quilombo dos Palmares, no período colonial – e até hoje integra o setlist das melhores festas do Brasil.
O movimento do Manguebeat, que se irradiou de Pernambuco para toda parte, influenciando a nova geração de artistas no país, foi o de maior impacto na música brasileira desde a Tropicália, na opinião do crítico Jon Pareles, em artigo publicado no jornal “The New York Times”. Junção das palavras “mangue” (ecossistema da costa do Nordeste do país) e “beat” (batida, em inglês, que remete também à linguagem dos códigos binários da informática, “bits”), o movimento adotou como símbolo o caranguejo, que vive nos manguezais e é capturado pelos trabalhadores da região, e uma antena parabólica enfiada na lama. O crustáceo também serviu ao título do manifesto que originou o movimento em 1991, “Caranguejos com cérebro”.
Na TV e no cinema
A Nação Zumbi marcou presença nas trilhas sonoras de novelas de grande audiência da TV Globo, a exemplo de “Irmãos Coragem” (1995), “Cordel encantado” (2011) e “O rebu” (2014), e em importantes títulos do cinema brasileiro, como “Baile perfurmado” (1997), “Amarelo manga” (2003), “Besouro” (2009) e “Senna” (2010), o documentário sobre o piloto brasileiro de Fórmula-1 Ayrton Senna, para o qual Du Peixe fez uma regravação exclusiva de “Maracatu atômico”.
Foi o atual vocalista da Nação Zumbi, aliás, quem sugeriu o título do documentário que refaz a trajetória do líder da banda e um dos idealizadores do Manguebeat, “Chico Science, um caranguejo elétrico”. Dirigido por José Eduardo Miglioli, o filme foi exibido no MIMO Brasil 2016.
‘Quando fica a cicatriz, fica difícil de esquecer…’
Inicialmente liderada pelo cantor e compositor Chico Science, que morreu no auge da fama em um acidente de carro, há exatos 20 anos, a Nação é formada agora por Jorge Du Peixe (voz), Lúcio Maia (guitarra), Dengue (baixo), Pupillo (bateria), Toca Ogan (percussão), Da Lua e Tom Rocha (alfaias), e permanece realizando concertos lotados no país e no exterior.
Apesar do baque monumental sofrido pela perda de Science, não foi o fim da Nação, que se reestruturou e se reinventou ao longo do tempo, gravando outros seis discos de estúdio: “CSNZ” (1998), “Rádio S.Amb.A” (2000), “Nação Zumbi” (2002), “Futura” (2005), “Fome de tudo” (2007) e o novamente intitulado “Nação Zumbi”, além de dois álbuns ao vivo lançados em DVD: “Propagando ao vivo” (2006) e “Ao vivo no Recife” (2012).
A banda admite, na apresentação do novo trabalho, que o intervalo entre os álbuns “foi mais do que salutar” e que os músicos se dedicaram a profícuos projetos paralelos. Entre eles, podemos destacar o trabalho do “power trio” da Nação – Lucio Maia, Dengue e Pupillo – ao lado da celebrada cantora e compositora da MPB Marisa Monte.
O trio participou da gravação do megahit da artista “Ainda bem”, do CD “O que você quer saber de verdade” (2011), e também da turnê promocional, em 2012 e 2013. Neste álbum mais recente, a artista carioca faz participação especial no CD “Nação Zumbi”, dividindo os vocais com Jorge du Peixe, na doce canção “A melhor hora da praia”, que são acompanhados por um naipe de cordas.
Uma das marcas da atual proposta sonora da Nação Zumbi é a assinatura de Berna Ceppas & Kassin na produção do álbum, gravado no Brasil e masterizado nos EUA. A dupla participa ainda com sintetizadores e programações, que se agregam ao som peculiar do sexteto. A lista de convidados especiais inclui o tecladista norte-americano Money Mark, parceiro antigo do grupo e co-produtor de “Fome de tudo”, e Mario Caldato Jr., brasileiro radicado nos EUA, responsável pela mixagem de algumas faixas em Los Angeles.
No palco do MIMO Amarante, a banda mostrará algumas das músicas deste CD – todas são de autoria de Jorge du Peixe, Dengue, Pupillo e Lucio Maia – como o iê-iê-iê “Cicatriz”, que abre o disco, “Um sonho”, “Foi de amor” e “Defeito perfeito”, além dos aguardados clássicos da Nação, a exemplo de “Manguetown”, “Meu maracatu pesa uma tonelada” e “Blunt of Judah”.