Carlos Malta & Pife Muderno dão novo sopro à música popular
Por Deborah Dumar
Inspirado nas tradicionais bandas de pífano que se multiplicam no Brasil, em particular na Região Nordeste, o flautista, saxofonista e compositor carioca Carlos Malta criou o Pife Muderno, com o intuito de fazer a leitura contemporânea de clássicos da música popular.
Inserindo elementos do jazz, do rock, entre outras influências, aos ritmos brasileiros, o criativo grupo reúne alguns dos melhores instrumentistas da atualidade. Além de Malta, o original sexteto é integrado pela flautista da Sinfônica Nacional Andrea Ernest Dias e os percussionistas Oscar Bolão (caixa e pratos), Durval Pereira (zabumba), Marcos Suzano e Bernardo Aguiar (pandeiro). Eles são atração do dia 25 de janeiro no Royal Concert Hall, de Glasgow, no Showcase Scotland 2017, do festival escocês Celtic Connections.
Em seus concertos, os músicos passeiam, com alegria e vigor, por composições e sucessos de artistas de diferentes épocas e origens, como Edu Lobo e Capinam (“Ponteio”), Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira (“Asa branca”, “Assum preto”), Jackson do Pandeiro (“Chiclete com banana”), Hermeto Pascoal (“Arrasta-pé alagoano”), Sebastião Biano e Caetano Veloso (“Pipoca moderna”), João do Vale (“O canto da ema”), Guinga e Aldir Blanc (“Nítido e obscuro”).
Enfatizando o timbre intenso dos pífanos, que é uma adaptação indígena das flautas europeias e que chegaram ao país pelas mãos dos portugueses, Malta também compõe peças para esta formação, como “Tupyzinho” e “Lá no Suzano”. Os arranjos frequentemente fazem referência a mestres da música clássica, a exemplo de Villa-Lobos (“O trenzinho caipira”) e Ravel (“Bolero”).
Porém, nenhum concerto de Carlos Malta & Pife Muderno é igual a outro, uma vez que seus integrantes não seguem partituras, nem se encontram para ensaiar. Depois de 20 anos de estrada, eles tocam na base do “olho no olho” e o resultado é estupendo! “Sempre quis fazer uma banda de pífanos. Depois de 12 anos trabalhando com Hermeto Pascoal, decidi seguir carreira solo e lancei dois grupos, o Pife Muderno e o Coreto Urbano, em 1994”.
Aclamados pela crítica e as plateias do mundo, dos Estados Unidos à China, Carlos Malta & Pife Muderno tiveram o primeiro álbum indicado ao Grammy Latino e o mais recente, gravado ao vivo em Pequim, no Forbidden City Music Hall, onde apresentaram um concerto a convite da Embaixada do Brasil.
Bandas de pífanos querem se tornar Patrimônio Imaterial
O fascínio de Carlos Malta pelo som do pife – também chamado de pífano ou pífaro – surgiu na adolescência, em 1972, quando Gilberto Gil lançou o histórico “Expresso 2222”. O álbum que marcou a volta do artista baiano ao Brasil, depois de três anos de exílio em Londres, era muito aguardado pelos fãs do cantor e compositor tropicalista.
A faixa de abertura deixou Malta perplexo: “Tinha 12 anos de idade e tocava fife. Quando botei o disco na vitrola, estava esperando a voz e o violão do Gilberto Gil, que estava acostumado a ver na televisão. De repente, comecei a ouvir uma flauta, uma zabumba, e nada da voz ou do violão do Gil… A faixa era toda instrumental e quem gravou foi a Banda de Pífanos de Caruaru, tocando ‘Pipoca moderna’!”, relembra o multi-instrumentista, que, depois dessa experiência, ficou interessado em aprofundar seus conhecimentos sobre a flautinha de bambu.
De fato, foi Gilberto Gil quem, no final dos anos 1960, chamou a atenção do Brasil para a importância cultural e histórica da banda de pífanos, que ele reconheceu como uma das principais influências da Tropicália. Esses conjuntos instrumentais de sopro e percussão, característicos da música folclórica brasileira, esperam ser reconhecidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional como Patrimônio Imaterial da Cultura.
A solicitação foi entregue ao Iphan, na edição de 2015 do evento Tocando Pífanos, em Olinda. Malta participa desta luta, ao lado do produtor do evento, Amaro Filho, pesquisadores e numerosos músicos que ajudaram na coleta de pífanos de várias procedências, CDs, fotos, reportagens, transcrições e livros, entre outros artigos, para fundamentar o pedido. Por sua vez, Malta, que também é educador, idealizou e protagonizou um documentário, onde procura desvendar as raízes do pífano “Xingu Cariri Caruaru carioca”, dirigido por Beth Formaggini e exibido com grande sucesso no Festival MIMO de Cinema.
O multi-instrumentista, que já participou de algumas edições do MIMO, em concertos de diferentes formatos, conta que ficou muito feliz com o convite da diretora-geral do festival, Lu Araújo, para integrar a seleção de artistas brasileiros em Glasgow. “No MIMO, fiz concerto na Capela Dourada, de Recife, toquei com um quarteto de cordas, o Pife Muderno e a Banda Sinfônica Mangaio, só com o Pife e como convidado da Orquestra de Sopros Pro Arte na homenagem a Gilberto Gil”, enumera o artista, destacando que “Lu Araújo, com seu entusiasmo, agregou parceiros importantíssimos para a expansão do MIMO, sem perder a qualidade artística e reunindo importantes expressões, da música clássica à popular”.
Saiba mais sobre o artista em carlosmalta.com.br
Para mais informações: celticconnections.com